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domingo, 24 de julho de 2011

ALGUNS CONCEITOS IMPORTANTES




Racismo é a tendência do pensamento, ou o modo de pensar, em que se dá grande importância à noção da existência de raças humanas distintas e superiores umas às outras, normalmente relacionando características físicas hereditárias a determinados traços de caráter e inteligência ou manifestações culturais. O racismo não é uma teoria científica, mas um conjunto de opiniões pré concebidas que valorizam as diferenças biológicas entre os seres humanos, atribuindo superioridade a alguns de acordo com a matriz racial. A crença da existência de raças superiores e inferiores foi utilizada muitas vezes para justificar a escravidão, o domínio de determinados povos por outros, e os genocídios que ocorreram durante toda a história da humanidade e ao complexo de inferioridade, se sentindo, muitos povos, como inferiores aos europeus.
O racismo é um preconceito contra um “grupo racial”, geralmente diferente daquele a que pertence o sujeito, e, como tal, é uma atitude subjetiva gerada por uma sequência de mecanismos sociais. Um grupo social dominante, seja em aspectos econômicos ou numéricos, sente a necessidade de se distanciar de outro grupo que, por razões históricas, possui tradições ou comportamentos diferentes. A partir daí, esse grupo dominante constrói um mito sobre o outro grupo, que pode ser relacionado à crença de superioridade ou de iniquidade.

Xenofobia é o medo irracional, aversão ou a profunda antipatia em relação aos estrangeiros, a desconfiança em relação a pessoas estranhas ao meio daquele que as julga ou que vêm de fora do seu país.
A xenofobia pode manifestar-se de várias formas, envolvendo as relações e percepções do ingroup ou endogrupo em relação ao outgroup ou exogrupo, incluindo o medo de perda de identidade, suspeição acerca de suas atividades, agressão e desejo de eliminar a sua presença para assegurar uma suposta pureza. Xenofobia pode também assumir a forma de uma "exaltação acrítica de outra cultura" à qual se atribui "uma qualidade irreal, estereotipada e exótica.A xenofobia pode ter como alvo não apenas pessoas de outros países mas de outras culturas, subculturas ou sistemas de crenças. O medo do desconhecido pode ser mascarado no indivíduo como aversão ou ódio, gerando preconceitos. Note-se, porém, que nem todo preconceito é causado por xenofobia.

Sexismo é termo que se refere ao conjunto de ações e ideias que privilegiam entes de determinado gênero (ou, por extensão, que privilegiam determinada condição sexual) em detrimento dos entes de outro gênero (ou condição sexual). Embora seja constantemente usado como sinônimo de machismo é na verdade um hiperônimo deste, já que é possível identificar diversas posturas e ideias sexistas (muitas delas bastante disseminadas) que privilegiam o gênero feminino em detrimento do gênero masculino (há controvérsias, pois muitos desses "privilégios" dados às mulheres na verdade as aprisionam em padrões limitantes e opressivos que exigem comportamentos considerados moralmente superiores em relação aos dos homens). Existem características comportamentais que são intrínsecas a determinado gênero, de modo que todas as pessoas deste gênero as possuem (visto em generalizações como "todo homem é mulherengo" ou "toda mulher é delicada" ou "todo homossexual é gentil").  Diferentes termos podem ser usados para nomear conjuntos de ideias e ações sexistas de acordo com o gênero afetado. O sexismo contra homens é chamado de misandria ou androfobia. O sexismo contra mulheres é comumente denominado de machismo, chauvinismo ou misoginia. As formas de sexismo contra LGBT podem ser genericamente nomeadas como homofobia (contra homossexuais), bifobia (contra bissexuais), além de outros termos, de acordo com cada "categoria" da LGBT.

Machismo ou chauvinismo masculino é a crença de que os homens são superiores às mulheres. A palavra "chauvinista" foi originalmente usada para descrever alguém fanaticamente leal ao seu país, mas a partir do movimento de libertação da mulher, nos anos 60, passou a ser usada para descrever os homens que mantém a crença na inferioridade da mulher, especialmente nos países de língua inglesa. No espaço lusófono, a expressão "chauvinista masculino" (ou, simplesmente, "chauvinista") também é utilizada, mas "machista" é muito mais comum. É bastante comum a idéia de que o feminismo é um equivalente direto ao machismo, o que é a principio equivocado, já que o feminismo apregoaria em primeiro plano a igualdade de direitos para as mulheres e a libertação feminina de padrões e situações opressoras da sociedade patriarcal.  

Feminismo é um movimento social, filosófico e político que tem como meta direitos equânimes(iguais) e uma vivência humana liberta de padrões opressores baseados em normas de gênero. Envolve diversos movimentos, teorias e filosofias advogando pela igualdade para homens e mulheres e a campanha pelos direitos das mulheres e seus interesses. De acordo com Maggie Humm e Rebecca Walker, a história do feminismo pode ser dividida em três "ondas". A primeira teria ocorrido no século XIX e início do século XX, a segunda nas décadas de 1960 e 1970, e a terceira teria ido da década de 1990 até a atualidade. A teoria feminista surgiu destes movimentos femininos, e se manifesta em diversas disciplinas como a geografia feminista, a história feminista e a crítica literária feminista. O feminismo alterou principalmente as perspectivas predominantes em diversas áreas da sociedade ocidental, que vão da cultura ao direito. As ativistas femininas fizeram campanhas pelos direitos legais das mulheres (direitos de contrato, direitos de propriedade, direitos ao voto), pelo direito da mulher à sua autonomia e à integridade de seu corpo, pelos direitos ao aborto e pelos direitos reprodutivos (incluindo o acesso à contracepção e a cuidados pré-natais de qualidade), pela proteção de mulheres e garotas contra a violência doméstica, o assédio sexual e o estupro, pelos direitos trabalhistas, incluindo a licença-maternidade e salários iguais, e todas as outras formas de discriminação.

Homofobia é uma série de atitudes e sentimentos negativos em relação a lésbicas, gays, bissexuais e, em alguns casos, contra transgêneros e pessoas intersexuais. As definições referem-se variavelmente a antipatia, desprezo, preconceito, aversão e medo irracional. A homofobia é observada como um comportamento crítico e hostil, assim como a discriminação e a violência com base em uma percepção de orientação não-heterossexual. Em um discurso de 1998, a autora, ativista e líder dos direitos civis, Coretta Scott King, declarou: "A homofobia é como o racismo, o anti-semitismo e outras formas de intolerância na medida em que procura desumanizar um grande grupo de pessoas, negar a sua humanidade, dignidade e personalidade." Em 1991, a Anistia Internacional passou a considerar a discriminação contra homossexuais uma violação aos direitos humanos.  Entre as formas mais discutidas estão a homofobia institucionalizada (por exemplo, patrocinada por religiões ou pelo Estado), a lesbofobia, a homofobia como uma intersecção entre homofobia e sexismo contra as lésbicas, e a homofobia internalizada, uma forma de homofobia entre as pessoas que experimentam atração pelo mesmo sexo, independentemente de se identificarem como LGBT.                     
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Wikipédia
Por Grupo MSul04 "Performance Negra"


ENTREVISTA


Mulheres Negras - do umbigo para o mundo
http://www.mulheresnegras.org

Terra Negra
África-mulher princípio-ninho.
Mátria-África matriz transformadora.
Telúricas poeiras e montanhas se fundem.
Criadoras e Criaturas se confundem.
Terra, planeta de seios fartos, que a todos alimenta.
Terra, trilha chã, que produz, trilha fêmea, sã que conduz.
Terra-chão, terreiro, segurança e firmeza...
meu caminhar primeiro.
Terra ora, cultura gera, ora cultiva hera.
Mulher, terra, existência que se perpetua.
Tás, oyás euás, negras terras, mulheres negras...
Resistência que se cultua!
Neuza Pereira
No dia 08 de maio, Neusa das Dores Pereira foi homenageada com a moção “Negras Guerreiras”, oferecida pela Câmara de Vereadores, uma iniciativa do Gabinete da Vereadora Jurema Batista. O título tem o objetivo de estimular mulheres que, como Neusa, têm dedicado grande parte de suas vidas à luta pela emancipação das mulheres negras do Estado do Rio de Janeiro.
Mulheres Negras: do umbigo para o mundo teve uma interessante conversa com Neusa e disponibiliza aqui como forma de inaugurarmos mais um espaço de socialização onde o mais importante será nos conhecermos melhor. Sintam-se à vontade para participar, ele está aberto a tod@s aquel@s que têm contribuído para o fortalecimento da comunidade negra. Esperamos encontrá-l@s aqui logo, logo!

MN - Nossa primeira curiosidade é saber o que a faz entrar tão obstinadamente na luta pela valorização da comunidade negra, mais especificamente das mulheres negras? 

Neusa - Engraçado, eu me tenho feito muito essa pergunta ultimamente. Hoje, eu acho que a presença da minha mãe está muito forte nessa história. Minha mãe tinha uma preocupação muito grande, embora semi-analfabeta, com a comunidade onde ela estava inserida. Eu morava num subúrbio do RJ. Ela era uma das "Donas" do morro. Na comunidade negra, esse título tem um significado muito próprio. Ser uma Dona/Tia é muito importante dentro da comunidade, isso as diferenciam de uma mulher qualquer. Embora jovem, ela era extremamente respeitada na comunidade. Na minha casa, ficavam mulheres que os maridos brigavam, espancavam, botavam para fora de casa; ela recolhia essas mulheres, as crianças. Minha mãe não tinha homem, a única arma que ela usava era a palavra, era um poder de liderança muito grande porque ela não contava com religião. Eu tenho certeza que começa ali minha história e essa preocupação com as mulheres.  Eu penso muito na recriação das ialodês que, na África, constituíam um poder. Eu acho que essas mulheres, essas Donas, essas Tias são um tipo de recriação das ialodês aqui no Brasil. Mais tarde, entro para o Ginásio e me lembro muito de uma aula de História dada por uma professora. Era o Colégio Paulo de Frontin e para ser admitida como aluna tínhamos que nos submeter a um concurso muito duro. Na escola inteira éramos duas ou três negras, percebíamos que não éramos bem vindas naquele espaço. Era um colégio tradicional na Tijuca, só de moças de classe média, classe média alta. Nessa aula, a professora estava dando uma aula que falava sobre as origens da população brasileira. Ela dizia que os negros brasileiros descendiam de dois tipos básicos de negros: os bantos e os sudaneses. Segundo ela, os sudaneses eram uma maravilha, tinham ido para Bahia, para o Maranhão, eram adiantados, bonitos, altos etc... Os bantos, ao contrário, eram uns coitados, estúpidos, feios, era uma raça feia, boçal, baixa, atarracada, não servia par absolutamente nada. Ela dizia que para o Rio de Janeiro, Espírito Santo veio essa turba, ela chamava de turba! E explicava que era por isso que aqui só tinha negro ladrão, vagabundo etc... Nunca me esqueço dessa aula porque ela falava olhando o tempo inteiro para mim! Eu me perguntava "O que eu tenho com isso? Eu não sou isso." Eu não me reconhecia naquela fala. Eu sentia que ela estava me atacando, mas com 11, 12 anos eu não entendia o porquê dela está me atacando. Eu ali já estava me sentindo negra e fora de alguns esquemas por ser negra. E dali começa algum tipo de consciência. Na verdade, foi essa professora que começa com isso.

MN - E como se dá a sua incursão no movimento de mulheres negras?

Neusa - Primeiro participo do movimento estudantil. Mais tarde, eu vou para o movimento sindical e bem mais tarde para o SEPE (Sindicato Estadual de Profissionais de Ensino). Antes disso, tentei o Movimento Negro, mas ele não me agradou, achei que era uma coisa muito elitizada, não era o que estava buscando na época. Me encontro melhor, em 1979, no movimento sindical. Como professora, as coisas aí começam a se misturar. Vêm as questões de mulher, de negra, de professora, de trabalhadora. Montamos alguns grupos de trabalho. Coincide também com um projeto que a Prefeitura lança chamado Zumbi, que colocava uma série de discussões de negritude para dentro das escolas. Junto com isso, criamos um grupo de reflexão constituído por mulheres. Há a necessidade que as professoras entendam a questão de gênero. O machismo da escola é terrível porque as professoras são muito machistas. São também racistas mesmo que sejam negras.  Fundamos em Jacarepaguá o primeiro grupo de mulheres negras. Eu digo nós, porque é um grupo de mulheres bastante interessantes. Um grupo de discussão cuja a idéia inicial era só conversar com as mães, saber porque estava aquela confusão na escola - é uma época de criação dos Cieps. Mães, professoras, funcionárias de escola começam a discussão racial em Jacarepaguá. Coincide que o Rio de Janeiro estava organizando o Primeiro Encontro Estadual de Mulheres Negras. Essa vai ser a maior delegação dentro do encontro. A partir daí, começa a militância dentro do movimento de mulheres negras organizadas. A organização política das mulheres com as características de hoje surge em Guaranhuns, em Pernambuco. Vem com a idéia de interferir mais diretamente, de fazer com que as mulheres negras líderes se conheçam, tenham sua própria organização, seus próprios encontros, espaços. Guaranhuns é que dá essa percepção.  Eu sempre gosto de dizer que hoje já tem instalado dentro do movimento negro um pouco da questão de gênero e dentro do feminista um pouco da questão racial, mas isso não foi sem dor para nenhum dos dois lados. Eu vivi bem esses dois lados, foi bastante difícil, eu acredito que ainda é bastante difícil essa incorporação.  O Primeiro Encontro Nacional de Mulheres Negras (ENEM) acontece em Valença, 1988. Foi um encontro muito bonito. Apesar das dificuldades, foi um encontro que reuniu 500 mulheres, 19 estados, se não me engano. Foi um encontro de grande representatividade. Nesse momento a fala da mulher negra não estava pronta. A partir desse Encontro, criou-se a Comissão Nacional de Mulheres Negras. No Rio de Janeiro foram eleitas eu, Maria Lucia de Carvalho e Sandra Helena Bello. Durante o processo organizativo do II ENEM, levamos duas companhas básicas: 1) contra esterilização em massa de mulheres negras e 2) não matem nossas crianças. "Não matem nossas crianças" era uma campanha que todo mundo já tinha mais ou menos conhecimento. Ao contrário, o quadro de esterilização de mulheres negras no Brasil não era muito divulgado. Esse era um projeto do Programa de Mulheres do CEAP. Ele foi difundido para o Brasil através dessa Comissão Nacional de Mulheres Negras. Se ampliou muito o debate contra a esterilização em massa das mulheres negras. Eu lamento que essa história tenha se perdido e assim fica parecendo que foi resolvida a questão. Fizemos reuniões no Brasil inteiro e fomos abrindo o leque de discussões.  O II ENEM, em Salvador, 1991, já há um salto. Ai você já tem a fala específica de mulheres negras com imensa reflexão. Aboliu-se a idéia de representatividade e ficou estabelecido que todas mulheres negras que quisessem participar do encontro poderiam fazê-lo. As mulheres negras começam a pesquisar, trabalhar, se preparar para estar no Encontro com uma fala de mulheres negras! Nesse encontro tivemos alguns problemas políticos na própria cidade, em Salvador. O pessoal rachou. O Encontro saiu com muitos problemas Conseguimos garantir a continuidade da Comissão Nacional, a periodicidade do Encontro, algumas bandeiras de luta e que o próximo encontro seria no Distrito Federal.

MN - Atualmente você é uma das coordenadoras do Centro de Documentação e Informação Coisa de Mulher (CEDOICOM). Quais são seus objetivos

Neusa - Nosso objetivo ao criar o CEDOICOM era buscar o saber produzido, tão distante da maioria das mulheres negras, e devolvê-lo às mulheres negras utilizando linguagens mais adequadas, através de cassetes, cartilhas, seminários, cursos, palestras etc.  Temos também outros projetos: "Saúde de Mulher", onde a gente trabalha principalmente com as doenças sexualmente transmissíveis e Aids; "Capacitação Profissional", onde as mulheres aprendem eletricidade, elas são capazes de fazer toda a instalação elétrica de um prédio, consertos de eletrodomésticos, manutenção hidráulica e agora nós acrescentamos dois módulos, de chaveiro e de telefonia. Esse projeto é destinado à mulheres desempregadas, subempregadas, egressas do sistema penal e meninas em situação de risco. Temos um projeto dentro do sistema penal. Tivemos problemas porque esse último governo era extremamente fechado e a gente não conseguiu trabalhar com mulheres na cadeia. Agora, com esse novo governo, esperamos tocar esse projeto ainda esse ano. A gente agora vai tentar colocar esses cursos dentro do sistema penitenciário. Temos também um projeto de assessoria a parlamentares e a outras ongs. P:or exemplo, a lei 2.475, de 1996, que proíbe a discriminação de gays, lésbicas e travestis em estabelecimentos públicos e comercias, foi uma iniciativa nossa em conjunto com a Comissão de Direitos Humanos da ALERJ. Estamos também trabalhando junto com o SEPE.


MN - Qual é a ligação do CEDOICOM com o Coletivo de Lésbicas do Rio de Janeiro?

Neusa - Em 1995, a gente funda o COLERJ (Coletivo de Lésbicas do Rio de Janeiro). Coisa de Mulher (CEDOICOM) foi fundada em 1994. Em princípio, nós achávamos que os dois tinham que andar separados, o Coletivo era uma coisa e o Coisa de Mulher outra. Depois, numa assembléia, vimos que não era bem assim, até porque era eu e Elisabeth Calvet que dirigíamos os dois. As mulheres do Coletivo de Lésbicas pediram para ficar junto ao CEDOICOM como um programa até o ano 2000, ou até que se decida o contrário. O COLERJ tem um corpo consultivo, um conselho deliberativo totalmente autônomo.  O Coletivo de Lésbica está começando a se estruturar aqui no Rio de Janeiro. As mulheres lésbicas ou estavam presas aos movimentos sociais, mas caladas sobre sua sexualidade ou estavam dentro do movimento feminista falando um pouquinho mais. Nos outros movimentos elas estavam sempre de bocas fechadas.
MN - Mesmo dentro do Movimento de Mulheres Negras?
Neusa - Mesmo lá! O MMN dá algumas cutucadas. No I Encontro já tivemos uma reunião, que algumas olhavam meio estranhas, o Segundo já foi mais aberto, mas de uma forma geral é um assunto que poucos grupos no Brasil levam. Eu sei do CRIOLA, que está levando a discussão enquanto lésbicas negras mas eu não sei de outros grupos que batalhe nessa questão, embora um bom número de dirigentes de ONGs de mulheres sejam lésbicas. Mesmo quanto as lésbicas estão junto aos homens nos movimentos mistos de gays e de lésbicas também encontram dificuldades. Os homens é que sabem de tudo, os homens é que levam tudo, o dinheiro está na conta deles. Se tem uma reunião lá no Canadá, o homem vai, mas se tem uma reunião ali em Nova Iguaçu, a mulher não tem dinheiro, não tem nada. Os gays não deixam de ser homens!

MN - Como é que vocês conseguiram trazer o V Encontro de Lésbicas da América Latina e do Caribe para o Rio de Janeiro?

Neusa - Em 1996, nós fizemos, com muito sucesso, o I Seminário Nacional de Lésbicas. Até aqui não havia tido nenhum encontro nacional de lésbicas. Foi de 29 de agosto a 1 de setembro. Foi um sucesso estrondoso. Foi tão grande que nesse encontro foi tirado o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica que é o dia 29 de agosto. O COLERJ é dirigido por negras, a prioridade é as mulheres negras, a discussão racial é forte, embora junte outros segmentos de mulheres. Fazemos oficinas, discussões, vídeos, grupos de auto-ajuda.  Voltando a sua pergunta, como o I Seminário foi um grande sucesso e também com a velha idéia de fortalecer os outros estados, o II Seminário foi em Salvador, o III em Minas, esse trabalho ganhou corpo, cresceu. As mulheres que estavam organizando os encontros internacionais estavam sem lugar para fazer o V Encontro de Lésbicas Feministas da América Latina e do Caribe. Em princípio esse encontro deveria ser na República Dominicana, mas a situação de lésbicas é bastante complicada na América Latina como um todo. Então qual seria o país onde poderíamos colocar esse encontro de uma forma mais aberta? O Brasil surgiu como alternativa. Nós já tínhamos essa história de encontro de mulheres negras, de encontros de lésbicas, de pioneirismo. Perguntaram se nós aceitaríamos e loucamente aceitamos. loucamente porque na época não tínhamos estrutura nenhuma, nem computador, nem telefone. E a história está ai. O Encontro reuniu cerca de 330 mulheres.
MN - E sobre a moção que vocês ganharam?




Neusa - Ganhamos três moções. A Câmara de Vereadores dá moções em função de trabalhos relevantes que você tenha prestado na área social. Temos uma moção por serviços prestados na área deSaúde, HIV e AIDs. Vamos fazer um Seminário agora para formação de mulheres que vão trabalhar com AIDs, Feminização e Pobreza no interior do Estado, conseqüentemente, vamos falar para mulheres negras. A outra moção é de Cidadania e Direitos Humanos. A terceira moção, Negras Guerreiras, foi oferecida pela Câmara especificamente para mim. Foi no dia 08 de maio. Essas moções são uma iniciativa da Vereadora Jurema Batista e têm o objetivo de ajudar a incentivar e contribuir para a auto-estima das mulheres negras.

MN - O que você sentiu as receber essa última moção? 
Neusa - Acho que dá mais responsabilidade. Na verdade, é tipo assim: "a peteca não pode cair nunca". É um reconhecimento, mas que aumenta minha responsabilidade e compromisso. Eu estou com 54 anos e às vezes penso em parar, dá uma descansada, mas é impossível. É claro que também te incentiva mais, acaricia o ego e dá uma animada legal.
MN - Para finalizar, utilizando todos os seus anos de praia, qual a avaliação que você faz sobre o movimento de mulheres negras até aqui?
Neusa - Acho que caminhou, mas também demos alguns passos para atrás. Eu não acho que é só o movimento de mulher negra, mas os movimentos sociais como um todo. Por vários motivos, temos alguns entraves e algumas armadilhas. A gente discute muito no campo das idéias, eu costumo dizer que a gente discute muito do pescoço para cima, mas do pescoço para baixo... câncer de colo uterino, câncer mamário, os miomas, as prisões, a discriminação policial... A gente tem uma dificuldade enorme de caracterizar esses crimes policiais como crimes raciais. Isso não é louco? Então, eu acho que falta uma ação. Não estamos discutindo gente, mas as idéias. A gente tem que brigar para ter nosso canal de comunicação próprio, o nosso horário nobre. São tipos de coisas que a gente tinha que fazer olhando para a gente, para o nosso corpo, a nossa saúde, para nossa auto-estima. O nosso trabalho hoje é pequeno, porém super-respeitado. 



Nesta entrevista, pudemos observar o traço marcante da força da mulher nos movimentos sociais, principalmente, no que diz respeito à conquista de espaços na sociedade em relação à dignidade e ao respeito aos direitos da mulher negra. As conquistas do feminismo e da negritude no âmbito das políticas sociais no Brasil conforme a entrevistada afirma, caminham lentamente, mas já surtem efeitos sobre as leis e denotam relativa positividade no que concerne superação de preconceitos e discriminações, embora, paulatinamente falando.
Por Monica Pontes da Costa Oliveira,
Grupo MSul "Performance Negra"

IGUALDADE E DIVERSIDADE

        "Não é o homem superior à mulher, nem a mulher superior ao homem. Mas não é certo dizer que ambos são iguais em tudo. A realidade é maior e mais bonita, a mulher possui qualidades especificamente femininas que, quando se unem as qualidades especificamente masculinas, permitem conseguir resultados maiores, mais expressivos e mais ricos que poderiam se alcançar, quando cada um dos sexos trabalham separadamente. "
(D. Helder Câmara)







HOMENS E MULHERES -  A IGUALDADE DA DIVERSIDADE 


Esse tema da igualdade na diversidade, que estamos tratando hoje, é um tema inesgotável. Já venho trabalhando há um certo tempo nele mas cada vez que retomo, tenho a sensação de que ainda há muito por conhecer. E uma das razões pelas quais isto acontece é porque, nesta etapa de mutação da sociedade, esta temática também vem mudando rapidamente.
Estamos vivendo um processo de transformação. Na realidade, a sociedade está sempre em movimento, mas nesse momento a gente pode dizer que a humanidade vive um ponto de mutação. Aliás, este é o título de um livro muito conhecido[2] que fala da transformação profunda que vem se dando atualmente em vários níveis; neste contexto, a questão da relação entre homens e mulheres também vem sofrendo uma mudança significativa.
Vocês sabem que essa relação em cada fase da história e em cada cultura assume formas específicas: a sexualidade tem sido vivida de formas diferentes pelos seres humanos em etapas diferenciadas.
Se quisermos fazer um recorrido histórico bem sintético, podemos lembrar que na fase ancestral, na fase da pré-história, homens e mulheres viviam relações mais igualitárias e mais harmoniosas. Na realidade, a gente conhece pouca coisa desta fase - não existiam documentos escritos - mas descobertas arqueológicas, realizadas sobretudo pelas feministas que vêm trabalhando essa etapa, indicam que essa relação de igualdade era mais fácil entre homens e mulheres. Nesse período, descobriu-se a importância da mulher, porque era ela a responsável pela transmissão da vida; as primeiras imagens conhecidas dos seres humanos, são aquelas estatuetas pequenininhas, estatuetas de mulheres, de formas arredondadas, representando as deusas da fertilidade. Essa é uma imagem bonita para imaginar como é que a gente pode repensar uma maior igualdade nas relações entre homem e mulher, essa igualdade que, como vocês sabem, se perdeu depois.
A partir do período neolítico as relações se impõem como relações de hegemonia do masculino sobre o feminino. O que chamamos sistema patriarcal vem desde este período até hoje: só mais recentemente começou a se transformar.
Quando digo hoje, estou pensando especificamente no século XX. Claro que este processo começa um pouco antes, nos séculos XVIII e XIX. Mas no século XX há realmente uma mudança muito grande nas relações entre homens e mulheres, na medida em que as mulheres entram massivamente na esfera pública e começam a tomar consciência de que a situação de subalternidade em que viviam antes, não era uma situação justa para as mulheres, mas também não era para os homens. O que se quer com esse movimento, de maior igualdade entre as relações de gênero, não é apenas resolver o problema da mulher, mas o problema da relação entre homens e mulheres. Isso é interessante de sublinhar, porque no começo o movimento se preocupava quase que exclusivamente com “a libertação da mulher”, com “a situação da mulher”, falava-se muito nessa questão.
A partir da própria experiência do movimento foi se criando um novo conceito: o conceito de “gênero”, mostrando que não se trata apenas de libertar a mulher, mas de mudar essa relação de subordinação da mulher frente ao homem e, portanto, modificar também a situação do homem. É claro que se os dois estão em relação, de uma determinada forma, se é mudado o pólo dominado, o pólo dominante também se inverte. Isto não quer dizer uma inversão da dominação, pelo contrário, o que se quer é superar a dominação e estabelecer novas formas de relação.
Nesse sentido, o lema da Novamerica neste ano é extremamente rico, porque coloca mulheres e homens em parceria, ou seja, mostra que há um esforço a ser feito pelas mulheres, mas há também um esforço a ser feito pelos homens. E é nesse diálogo, entre uns e outros, que se podem criar novas relações de gênero.
Essa tomada de consciência e essa ruptura da ordem patriarcal foi realmente uma revolução social e cultural, talvez uma das revoluções mais profundas do século XX. Só que uma mudança assim não se faz de uma hora para outra: é indispensável um certo tempo – talvez mais longo do que o que poderíamos desejar – para que um sistema, que vinha sendo afirmado sem contestações durante séculos, consiga se transformar.
Aqui é importante um esclarecimento: quando falamos de subordinação, estamos falando de uma forma geral. Isso não quer dizer que as mulheres não tivessem um relativo poder em certas áreas e nem quer dizer também que a dominação tenha sido sempre igual em todos os tempos e lugares. Se fosse uma coisa tão monolítica seria difícil mudar. Ainda bem que sempre houve várias brechas, espaços diversos nos quais a mulher já vinha ocupando uma posição de poder. É por aí que passam as potencialidades de mudança, que vêm acontecendo.
Mas certamente este processo ainda está longe de terminar: há muito o que fazer pela frente. Não se supera de um momento para outro essa situação de desigualdade de gênero, que é a mais antiga das dominações. E quando atravessamos por um processo de transição, como este, é importante olhar para frente e ver tudo o que há que fazer, mas também olhar para trás e aprender um pouco com a própria experiência, com tudo que já se conseguiu, com tudo que se acertou, com tudo que se errou. Aí se colocam vários desafios e talvez o primeiro seja exatamente o desafio da igualdade.



A DIFERENÇA NO MERCADO DE TRABALHO.


Dos cerca de 3 milhões de estudantes matriculados no ensino superior, 56% são mulheres. No entanto, as mulheres representam 42% da população economicamente ativa no Brasil.

Sete em cada dez novas vagas no mercado de trabalho são preenchidas por mulheres. Porém, elas ganham em média 60% do salário deles.

Um em cada quatro lares é chefiado exclusivamente por mulheres
O índice de desemprego entre mulheres é 12,7%, enquanto entre os homens é de 5,9%.

33 % das mulheres que trabalham ganham mais do que o marido. No entanto, apenas 26% são consideradas cabeça de casal, ou seja, coordenam as despesas da casa e administram o orçamento familiar.

Apenas 6% dos cargos de chefia das 500 maiores empresas brasileiras são ocupados por mulheres. Apesar dos avanços, a participação das mulheres em altos cargos corporativos só será igual à dos homens daqui a 470 anos.

O tempo médio de permanência de executivos na empresa é de 10 anos para eles e de 5,4 anos para elas.

Para 52% das mulheres, estereótipos e preconceitos são os principais empecilhos para o seu avanço no mercado de trabalho. Para 85% dos homens, a falta de experiência é o principal obstáculo para as mulheres no mercado de trabalho.

Ø 26% das mulheres bem-sucedidas no mercado de trabalho afirmam que o marido tem ciúme de seu sucesso profissional. Seis em cada dez mulheres bem-sucedidas no mercado de trabalho e divorciadas acreditam que a sua carreira teve peso significativo no divórcio.

Fonte: Revista Veja, Especial HOMEM, Outubro de 2003.



IGUALDADE, EQUIDADE E "EQUILIBRAÇÃO”

Só se pode tomar consciência dessa situação de subordinação quando se afirma o princípio da igualdade. E isto aconteceu a partir do final do século XVIII, quando a Revolução Francesa proclamou os valores de ”liberdade, igualdade e fraternidade.” Estes se tornaram fundamentais, sobretudo nos séculos XIX e XX, enquanto valores da modernidade e se traduzem hoje em diversas áreas. Assim, no que se refere à igualdade, sua consciência não se dá apenas em relação ao gênero, mas também em relação a qualquer tipo de dominação ou de estrutura de subordinação que existe dentro da sociedade. É sempre importante lembrar que o contexto social em que vivemos é marcado por profundas desigualdades sociais, incluindo, além da desigualdade de gênero, também desigualdade de classe, desigualdade de raça e etnia, desigualdade de geração. Portanto, quando a gente luta contra a subordinação de gênero, isso implica também lutar contra todas as outras formas de opressão. É preciso que haja uma integração destas diversas lutas.
No caso das relações de gênero, o princípio da igualdade se concretiza exatamente para romper com a subordinação que existia antes. Com isto, entretanto, não se pretende chegar a uma posição totalmente uniforme na qual se rompam todas as diferenças, na qual se chegue a uma massa completamente homogênea. Pelo contrário, é muito importante manter a diversidade, ou seja, que homens e mulheres se reconheçam como tais.
O grande desafio é esse: manter essa tensão entre a igualdade e a diversidade. E é esse exatamente o dilema da nossa luta: lutar pela igualdade com os homens ou reivindicar a diferença como mulheres? Talvez, mais do que dizer “ou”, a gente teria que dizer “e”; quer dizer, ao mesmo tempo lutar pela igualdade e reivindicar a diferença. É uma luta bastante complicada.
Joan Scott, uma estudiosa do tema de gênero, diz o seguinte: “Na medida em que homens e mulheres são iguais enquanto seres humanos e diferentes quanto aos sexos, não se pode optar exclusivamente e de uma vez por todas, pela igualdade ou pela diferença”. Nesse sentido é que a gente descobre um conceito muito rico que é o conceito de eqüidade, que quer dizer exatamente isso: manter a igualdade na diferença ou manter a diversidade na igualdade.
Nessa perspectiva, há uma série de experiências que vão se fazendo, indicando formas diversas de equilibrar e de viver essa tensão permanente. Quando falo em equilíbrio, dá a sensação de ser uma coisa estática. Não é! De jeito nenhum! Pelo contrário, é um equilíbrio dinâmico, que está sempre em construção. Tenho uma amiga, Maria José Santos, que trabalha com consciência corporal e com a questão do movimento e que gosta de usar o termo “equilibração”. Acho interessante pensar desta forma: o equilíbrio se dá exatamente na ação e ele está sempre se criando e recriando.
Falar de eqüidade de gênero implica afirmar a igualdade de direitos e oportunidades. O que significa isso? Retomamos aqui a dificuldade de conseguir viver bem essa tensão entre igualdade / diversidade, quando temos papéis de gênero muito diferenciados: mulher que só faz uma coisa e homem outra. A imagem, por exemplo, da mulher que não entende de carro e do homem que não entende de cozinha, da mulher que tem que aparentar fraqueza e do homem que tem que aparentar fortaleza. A imagem desta polaridade entre homens e mulheres, com papéis muito definidos, pode ser sintetizada através da separação entre as duas esferas, do público e do privado, em que o homem estaria no mundo público e a mulher no mundo privado.
A transformação que começou a se dar, a partir do século XX, com uma maior participação da mulher no espaço público - através de sua entrada no mercado de trabalho, acesso à educação e direito ao voto - significou já uma alteração nesse esquema: começou a se romper essa polaridade tão violenta entre homem e mulher. Só que isso aconteceu ainda de forma parcial. A mulher começou a entrar na esfera pública, mas o homem continua ainda participando muito pouco da esfera privada.
Felizmente, a turma jovem está aí presente mostrando que é possível também para os homens assumir muito mais a esfera privada, o espaço doméstico, da casa e, sobretudo, o espaço do cuidado com as crianças. Descobrir a importância da paternidade e poder vivenciá-la concretamente é, para os homens, uma riqueza enorme. E este movimento está criando justamente esse espaço, essa possibilidade para que os homens assumam de alguma forma o seu lado feminino e para que as mulheres possam se afirmar na esfera pública, sabendo que terão uma retaguarda. Porque nós, mulheres, sabemos bem como é difícil dar conta de tudo, do trabalho fora de casa e do trabalho dentro de casa, sem poder, muitas vezes, partilhar todas essas etapas com o companheiro. Pensando um pouco nisso, queremos assinalar mais uma vez a importância da ideia de parceria, pela qual temos que lutar, sabendo, ao mesmo tempo, que é complicado mesmo, que ainda estamos engatinhando nessa primeira etapa.
Neste processo, será que poderíamos dizer que ele se completaria quando homens e mulheres participassem integralmente de ambas as esferas? Essa igualdade de oportunidades poderia significar uma dissolução das diferenças? Aqui, mais uma vez, vejo o risco de continuarmos a pensar na esfera pública com um modelo patriarcal: isto significaria que, para a mulher entrar no mundo público, o mundo dos homens, ela teria que se masculinizar. É aí que realmente deve-se descobrir esse equilíbrio, mantendo a própria identidade.
É complicado isso também por uma outra questão: é que não temos muitas categorias que nos ajudem a pensar esse processo de transformação, exatamente porque é um processo novo. Sabemos o que não queremos, como, por exemplo, continuar neste sistema patriarcal, dentro do sistema da subordinação, mas não sabemos bem como superar isso. Como vai ser? O que queremos?
Isto não se define “a priori”; é justamente a partir da experiência que vem se fazendo, na prática, que vai se formulando uma reflexão e um pensamento sobre a mesma. Neste sentido, esse trabalho que vocês estão fazendo aqui é extremamente importante, porque parte de experiências concretas que são muito enriquecedoras e que colocam desafios para se pensar novas categorias.



SEXO E GÊNERO

Neste sentido, um conceito que pode nos ajudar muito é o conceito de gênero. E aqui é importante esclarecer a diferença entre sexo e gênero. Eu estava dizendo que o conceito de gênero é muito rico, porque partiu da experiência de como homens e mulheres se relacionam. A diferença entre eles não se reduz apenas a uma dimensão anátomo-biológica – dada pelo sexo - mas se refere também à forma como esse sexo é vivido e é pensado em cada cultura. Ou seja, neste sentido, o gênero é uma construção social do sexo. Esse conceito é fundamental, porque nos ajuda a vencer o determinismo biológico, que, a partir de diferenças biológicas, legitima e torna irrefutáveis estruturas de subordinação. Ao contrário, o conceito de gênero enriquece nossa reflexão e permite perceber a subordinação baseada em formas culturais de vivenciar a sexualidade. Isto significa que estas não estão estabelecidas de uma vez por todas, mas, pelo contrário, podem ser – e estão sendo – modificadas.; ou seja o conceito de gênero abre as portas para pensar a superação da subordinação.
Isto é explicitado por duas correntes distintas: uma corrente normalmente chamada de essencialista, que parte da idéia de que a natureza feminina e masculina é algo dado, e é o que legitima de certa forma a essência da mulher e do homem. Essa corrente fixa a essência do homem e da mulher como se fosse uma coisa imutável.
Em seguida, vem uma outra corrente, denominada construtivista, que enfatiza a dimensão social e cultural das diferenças sexuais, mostrando que não se trata apenas de um dado biológico, mas da forma como esse dado é encarado em cada sociedade. Mas em reação ao essencialismo, essa corrente construtivista chegou a enfatizar tanto a influência do cultural, que quase se anulava o dado biológico. Isso acontece frequentemente: quando surge uma reação a algo que parece não explicitar bem a realidade, muitas vezes, essa reação elimina o outro aspecto. Neste caso, apagou-se totalmente o biológico como se este não tivesse também a sua importância; e aqui há uma dimensão a ser trabalhada, particularmente levando em conta todos os progressos atuais da Biologia. De qualquer forma, a corrente construtivista trouxe uma contribuição importante, fundamentando o conceito de gênero.
Mas este conceito, que foi - e continua sendo - tão rico para nós, começa também a ser criticado por uma outra vertente. Algumas feministas europeias e ligadas à psicanálise têm a sensação de que, ao limitar o debate a estas duas dimensões, biológica e cultural, fica subjacente a dicotomia entre corpo e mente - como se esta última fosse uma tábula rasa, influenciada totalmente pela cultura e o corpo fosse apenas um mediador passivo – sem levar em conta, além disso, um elemento muito importante que é o inconsciente.
Essa reflexão das psicanalistas europeias nos coloca um ponto de interrogação sobre essa influência do papel da dimensão psíquica. E leva a ampliar o conceito de diferenças sexuais, na medida em que implica diferenças anátomo-biológicas e diferenças sociais, mas implica, também, diferenças que estão no nível do inconsciente. Isso é importante para se pensar. Não se trata apenas de anatomias diferentes, mas de subjetividades vinculadas a um processo imaginário diferenciado. O sexo também se assume no inconsciente. Isso complica um pouco mais as coisas. Quando avançamos mais nessa temática, vemos como ela é complexa. Mas não se pode deixar de lado esse aspecto psíquico que é fundamental para entender o desenvolvimento tanto do homem quanto da mulher e as formas como as relações entre eles se estabelecem.
O grande desafio que está colocado para nós é exatamente essa articulação entre o biológico, o social e o psíquico, essa exigência de integrar esses distintos fatores. E é isso que vai nos ajudar a colocar a questão das diferenças sem recair no essencialismo. É claro que é sempre complicado, porque se começarmos a enfatizar muito as diferenças, volta-se ao risco outra vez de cair naquela separação que tínhamos visto no começo, naquela polaridade fechada que não nos ajuda nada para pensarmos relações de gênero mais igualitárias.
Direitos Humanos e a Inter-relação entre Feminino e Masculino.
Há que partir sempre do princípio da igualdade de direitos. O conceito de direitos humanos, obviamente, nos ajuda muito, porque ele nos dá uma plataforma básica: só a partir da igualdade de direitos é que se pode falar de diferenças sexuais. Essa tensão entre igualdade e diversidade que nos é dada no conceito de equidade, significa exatamente uma recuperação da identidade masculina e feminina, sem recair no esquema hierárquico. E possibilita olhares diferenciados. Esse foi o grande lema da Conferência das Nações Unidas em Beijing, que aconteceu em 1995, e que foi a maior conferencia internacional de mulheres. O lema era esse: “Olhar o mundo com olhos de mulher”. Isso quer dizer não perder a própria feminilidade, o que nos remete ao conceito do masculino e do feminino. O que significa não perder a feminilidade?
Podemos pensar esses conceitos de masculino e feminino como dois princípios, nos referindo à tradição taoista., com sua polaridade yin / yang . Acho interessante o símbolo que representa o Tao. Vocês se lembram? Há um lado branco e um lado preto que se complementam, mas dentro do branco tem um pontinho preto e dentro do preto tem um pontinho branco. Ou seja, há uma inter-relação entre os dois lados: eles formam a totalidade que é a energia originária, chamada pelos chineses de Chi.
Se entendemos o masculino e o feminino como princípios, podemos dizer que são aquelas energias primordiais que dão origem ao ser humano e que estão entrelaçadas: não se pode pensar o masculino sem o feminino e vice-versa. O importante é lembrar que ganham concretizações diferentes no ser homem e no ser mulher. Ou seja, podemos dizer que o princípio masculino e o princípio feminino são princípios inerentes ao ser humano. Estão presentes em qualquer ser humano só que de formas diferenciadas na mulher e no homem, mas ambos partilham dos dois princípios.
Creio que esta é uma forma rica para se pensar esta articulação das diferenças sexuais, na qual, partindo sempre do princípio da igualdade de direitos, recuperamos esse ser feminino e esse ser masculino.
É claro que isso coloca novos desafios, desafios permanentes. Como é que vamos criar a própria feminilidade em face da masculinidade do outro e vice-versa?
Podemos considerar que cada ser humano traz em si uma dimensão de exterioridade – que se manifesta na interação com a natureza, através do trabalho – e uma dimensão de interioridade – que é o universo do cuidado, dos sentimentos, da espiritualidade. A preocupação permanente é a de equilibrar em nós mesmos - de formas diferenciadas no homem e na mulher - estas duas dimensões, que remetem aos princípios do masculino e do feminino, yin e yang. Isso significa recuperar sobretudo a dimensão do feminino, que era a que se encontrava mais subalterna, considerada de segundo grau, e prioridade exclusiva das mulheres.
Foi o movimento de mulheres, entre outras forças - pois não foi a única! - que, no século XX, abriu novos horizontes, ao valorizar a dimensão do feminino. Anteriormente, a forma dualista de encarar o mundo separava o masculino e o feminino, e, analogamente, separava também o corpo e a mente. Mas não só separava, também hierarquizava: naturalmente o corpo era considerado o menos importante, diante da prevalência da mente e da razão. Para o pensamento racionalista, tudo que era corpo era considerado selvagem, precisava ser domesticado. Foram basicamente os movimentos de mulheres que trouxeram a revalorização de temas como corpo, sexualidade, direito ao prazer, direito de controlar a própria fecundidade. São temas importantes a serem trabalhados por todos nós, homens e mulheres.
Isso supõe também novas formas de pensar e de agir. As mulheres começam a descobrir que a forma de apreender o mundo não passa apenas e exclusivamente pelo pensamento racional, mas passa também pela intuição e pela emoção: são novas formas de produzir conhecimento, passíveis de serem conseguidas através de uma integração mais total de todas as nossa possibilidades. Ou seja, de não reduzir o ser humano apenas à sua racionalidade. Neste sentido, o movimento de mulheres vem criando uma riqueza muito grande na medida em que levanta questões para a própria epistemologia – quer dizer, na própria forma de produzir conhecimento – e afirma a importância de integrar o princípio feminino no campo do saber. Esse é um campo interessante no qual há muito o que avançar.
Outro campo é o que coloca a importância da relação, da solidariedade. Na medida em que o princípio feminino enfatiza estas dimensões, a presença da mulher pode ser um elemento importante para pensar as relações em um nível horizontal, em que todos contribuam, anulando subordinações hierárquicas e recuperando, portanto, um sentido de maior igualdade entre homem e mulher. Neste sentido, a ideia das redes - que vem se expandindo muito ultimamente - demonstra que é possível contribuir para o todo a partir da diversidade, numa linha mais horizontal, sem tanta verticalidade, sem tantas hierarquias. Isso é um ponto importante que vem sendo aberto.
E finalmente, o último ponto que é muito próprio do movimento de mulheres – e que decorre exatamente do princípio feminino em geral - é a idéia do caráter coletivo, comunitário da ação. Acho muito significativas, neste sentido, as tapeçarias da Idade Média: eram fabricadas a múltiplas mãos, não tinham um único autor ou melhor dizendo, uma única autora - porque se suspeita que nas tapeçarias trabalhavam sobretudo as mulheres - que fosse considerado responsável por elas. E o resultado era um belíssimo trabalho. Aqui, acho interessante ressaltar esse caráter coletivo da obra. É a ideia de “mutirão” e de solidariedade que já estava presente naquela época e que é muito própria desse princípio feminino. É freqüente vermos isso em movimentos e organizações de mulheres. Essa dimensão de “mutirão” e de partilha, é um aspecto muito rico, que está surgindo como um desafio para nós de todo esse movimento na linha de conseguir relações mais igualitárias entre homens e mulheres.
Queria terminar lembrando um fato atual, que me parece significativo e muito próprio desta dimensão feminina. Algumas mulheres descobriram, há alguns meses atrás, que o Prêmio Nobel vem sendo dado, ao longo de vários anos, prioritariamente aos homens. Ás vezes, lembramos o nome de alguma mulher - estou lembrando agora, o Prêmio Nobel da Paz dado a Rigoberta Menchú, que inclusive vem da América Latina – mas na realidade são poucas as mulheres que obtiveram o prêmio, em relação ao número de homens. Diante dessa constatação, estas mulheres resolveram fazer um movimento, sugerindo que para o próximo Prêmio Nobel fossem propostos nomes de mil mulheres, escolhidas por todo o mundo. E isso já está sendo feito. Estão sendo selecionados os nomes de mulheres de todos os países e de diversas classes sociais; aliás, o movimento se preocupa muito de que não sejam escolhidas apenas as mulheres mais notáveis ou as mais famosas, mas que se selecionem também mulheres que estão lá na base, cujos nomes não são tão conhecidos e que não estão na mídia mas que, no entanto, estão fazendo um trabalho fantástico.
Este “mutirão” mundial me parece muito significativo. E mesmo que não obtenha o prêmio Nobel, o simples fato de existir expressa esta dimensão do feminino, que precisa ser reconhecido como imprescindível, tanto para as mulheres como também para os homens. Só assim tanto umas quanto outros conseguirão realizar uma parceria que realmente respeite a igualdade e a diversidade e que ajude a construir um mundo mais justo e mais feliz.
Retirado do: http ://www.iserassessoria.org.br

Analisando esta matéria, podemos constatar que a vida real ainda mantém as desigualdades de gêneros, principalmente no que se refere ao campo de trabalho,mais ainda aos cargos de mando. Em Mimoso do Sul, essa realidade se caracteriza por exemplo na ocupação da Câmara de Vereadores, que, apesar de já ter havido vereadoras, nunca preencheu o número de vagas destinado a elas. Na prefeitura, em todas as décadas de existencia do município, só teve em sua história uma prefeita, a Srª Flávia Roberta Cysne Rangel. Em termos de cidadãos comuns, a questão da desigualdade entre os gêneros é algo mais camuflado e ameno.

Por Maria Aparecida R. Marques e Irene Cristina dos Santos Costa, 
GrupoMSul04 "Performance Negra"

MOVIMENTOS SOCIAIS


O Brasil é conhecido como país das diversidades culturais devido a misturas das raças indígenas, negra e branca, porém em consequência disso é campeão em desigualdade e discriminação. Pesquisas tem mostrado que para o país ser considerado desenvolvido, além das dimensões econômicas, são necessárias outras características sociais, culturais e políticas que influenciam na qualidade da vida humana.

Autores defendem que cabe os gestores identificarem e buscar solução para a erradicação as desigualdades contra mulheres e negros uma vez que estes têm buscado há tempos a igualdade com o devido respeito às diferenças. Por isso a necessidade de implantação de políticas publica que tem como atores os Movimentos Sociais.

Afinal o que são esses Movimentos? Maria da Glória Gohn, em seu livro Teoria dos Movimentos Sociais, afirma que não há um conceito sobre o assunto, mas vários dependendo do paradigma utilizado. Na ciência um paradigma surge toda vez que é difícil envolver novos dados em velhas teorias.

Em uma abordagem clássica os movimentos sociais eram vistos como fontes de conflito e tensões e eram marcados, em suas origens, pela bus¬ca do poder, pela violência e pelo controle. Porém na atualidade eles criam, recriam e garante a construção de uma ideia e uma prática cidadã em prol do bem comum.

No Brasil, os movimentos sociais ocorridos na década de 70 a 80 reivindicaram direitos sociais tradicionais para sobrevivências ao ser humano assim como a igualdade e a liberdade e a construção de uma democracia. Como exemplo podemos citar a luta das mulheres por creches na década de 70, um grupo de mulheres moradoras da periferia forma um movimento pro-creche que passa a discutir o direito das mulheres ao trabalho e o direito a educação desde a primeira infância. E com o apoio de outros movimentos sociais, pesquisadores/as e intelectuais, consegue-se inserir este tema na agenda política do governo. Como consequência desse movimento esse direito é resguardado pela Constituição Brasileira de 1988 em seu capítulo III, art. 208, inciso IV, afirma que o dever do Estado com a Educação será efetivado mediante a garantia de: atendimento em creche e pré-escolas as crianças de zero a seis anos de idade. 

A Lei das Diretrizes Bases da Educação 9394/96 afirma também que “o dever do Es-tado com a educação escolar pública será efetivado me¬diante a garantia de [...]: IV – atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de idade” (Título III, Do Direito à Educação e Do Dever de Educar, art. 4). Em 2007, o dia 12 de outubro foi instituído como Dia Nacional de Luta por Creche.



Por: Poliana da Silva Botelho,
Grupo MSul04 “Performance Negra”, baseado conceitos estudados no modulo I e em pesquisa na internet.